verso, prosa e frases soltas, gritos na noite, pulso que pulsa, meia-verdade, meia-justiça e um grilo falante

segunda-feira, 20 de abril de 2015

Éramos
Éros
Eu
E
Eva,
Éramos
Erva
Eu
E
Ela,
Erramos
Éros
Eretos
Erratas,
Eva
E
Eu,
Erguemos
E
Erramos
Eremitas

Eras
E
Eras


sexta-feira, 17 de abril de 2015

Se

Se fosse visível
O raio de sol
Que me atravessa quando sorris,

Se fosse dizível
A dor que sinto
Quando dói em ti,

Ou audíveis
As palavras que sussurro
Ao te ver dormir,

Se fosse desenhável
A ternura que sinto
Quando estou contigo,

Ou expressável
A magia de tocar
A tua pele,

Se fosse mensurável
A saudade na ausência 
e a mais estranha saudade 
que tinha antes de te conhecer,

Mas tudo são pálidas
sombras que saem
da minha boca
e da minha pena.


segunda-feira, 13 de abril de 2015

Domingueira

Domingo. Final da tarde. Da varanda observo a cidade que se derrama lá fora. Na rede, balançam eu e meu tédio. Por ser mais pesado, ele vai embaixo, comigo no colo. Até as árvores se movem lentamente. Vejo um dedo de mar rodeado por prédios de todos os lados. É uma cidade fantasma ou a preguiça fez outras vítimas? Cada balançar na rede a penumbra avança. Tomo coragem, levanto a cabeça e verifico a situação na janela da área de serviço - fundos do apartamento. Praquelas bandas o dia insiste ao fundo do horizonte, borrando de amarelo escuro as pontas das casas, tornando pro marrom, com a noite pintada de azul escuro que invade por cima. Umas luzes ao acenderem denunciam existência de vida pré-segunda-feira. Dou-me conta, de repente, por que os poetas e os apaixonados se encantam com o crepúsculo. A esta hora, nossos olhos acariciam o tempo. O Senhor, sempre faceiro e fugidio, revela um instante o instante. Para celebrar o momento conosco, a rede, o tédio e eu, eis que surge uma lua que mal cabe na varanda.


sexta-feira, 10 de abril de 2015

Sua mão mergulha em mim, nas águas turvas do sentir
Submersa, remexe, caminha e afunda um pouco os dedos na areia
Buscando alguma pedrinha, marisco, talvez pérola
Em forma de garra, vai arrastando, trilhando o solo
Cavando, cavando, termina por encontrar um objeto
Inexplicavelmente o mundo é abalado
Treme a terra, fortes ondas são desencadeadas, o céu fecha-se em tempestade
Assustada, não concebe ser a causadora dessa cena bestial
Ainda assim, solta o que preso estava,
Ao desenterrar as mãos percebe que seu braço estava mais a fundo que pensava
O mundo aos poucos torna a normalidade
Entretanto, seu braço continua a brotar da terra encharcada
É isso, você compreende finalmente, seu corpo cresceu de tal forma que, comprimido dentro de seu punho, o centro do meu mundo tinha feito tudo mais chorar.





quarta-feira, 8 de abril de 2015

Egoísta

Se você acha que tem pouca sorte
Se lhe preocupa a doença ou a morte
Se você sente receio do inferno
Do fogo eterno, de Deus, do mal
Eu sou estrela no abismo do espaço
O que eu quero é o que eu penso e o que eu faço
Onde eu tô não há bicho papão não
Eu vou sempre avante no nada infinito
Flamejando meu rock, o meu grito
Minha espada é a guitarra na mão

Se o que você quer em sua vida é só paz
Muitas doçuras, seu nome em cartaz
E fica arretado se o açúcar demora
E você chora, você reza, você pede, implora
Enquanto eu provo sempre o vinagre e o vinho
Eu quero é ter tentação no caminho
Pois o homem é o exercício que faz
Eu sei, sei que o mais puro gosto do mel
É apenas defeito do fel
E que a guerra é produto da paz

O que eu como a prato pleno
Bem pode ser o seu veneno
Mas como vai você saber... sem tentar?

Se você acha o que eu digo fascista
Mista, simplista ou antissocialista
Eu admito, você tá na pista

eu sou ista, eu sou ego
eu sou ista, eu sou ego
Eu sou egoísta
Por que não... Por que não...
Por que não... Por que não...

Raul Seixas


segunda-feira, 6 de abril de 2015

Soneto da Fênix


Ave Fênix, destrói os receios, queima a dor,
Trai a verdade. Risca o infinito azul.
Extrema, porém calma, põe a vida a dispor.
Devora a morte, não tem norte, não tem sul.
Ave, Fênix! Prosterno-me a seu louvor.
Sob suas garras, eleva cá meu corpo nu.
Desensina a fugir, me mostra toda cor,
Revolve minha carne e devora a cru.

Haver, Fênix, composto sua e minh’alma.
Nas veias, há de pulsar nosso sangue unido,
Adubando com cinzas o amanhecer.

Ah, Fênix, vi meu medo abatido em amálgama
À sua esperança. Vi ao longe: eu ungido 
Em fogo. Morto, sempre; eterno renascer.


sábado, 4 de abril de 2015

My Iraq


Quero uma poesia de olhos fechados, que não veja hipocrisias, atrocidades, que não veja nada Uma poesia alienígena, que não seja desse mundo nem tente entendê-lo Num papel que as balas não furem e as crianças, desesperadas, desmembradas, decapitadas, não sujem de sangue Não! Não quero papel algum, é resquício que nos incrimina, todos os homens Quero palavras sustentadas no vazio, sem lastro algum com a dor, a vida, ou seu extermínio Quero frases eternas, que nunca foram escritas, e nunca serão apagadas Velhos versos da Torre de Marfim, neo-simbolistas contextualizados Quero um poema que tenha vergonha de ser humano.


quinta-feira, 2 de abril de 2015

A lua, os meninos e o mar.

Receita caseira para uma boa publicação

Recolha da gaveta os textos que escreveu quando jovem. Também funciona com aqueles gravados num diretório remoto, se você não perdeu quando trocou de computador pela quinta vez. Neste caso, imprima. Reúna todos numa grande bacia. Acrescente 5 l de experiência e duas gotas de bom-senso (cuidado para não exagerar). Deixe de molho por aproximadamente 23 anos. Com auxílio de uma pinça grande, retire-os do recipiente delicadamente. É provável que os papéis estejam meio frágeis. Estenda um a um no varal do anti-heroísmo (se for o do seu vizinho, melhor ainda). Depois de algumas horas secando na sombra, todos os textos em que se consiga ler algo além do inconformismo sem sentido estão prontos para publicação! Entretanto, caso tenha restado pouca substância literária, não se chateie. Você agora tem todos os ingredientes para tentar de novo.

terça-feira, 31 de março de 2015

A velhice é também um castigo à soberba, de um dia acharmos que poderíamos ser eternos.

sábado, 28 de março de 2015

Narciso

Pobre poeta,
sou a palavra mais preciosa e precisa.
E me ignora, põe terra sobre mim,
cospe na minha cara!
Insulta, espanca.
Muda meu nome.
Esconde-se de mim.
Mas não escapa.

Cansado, humilhado,
me redime.
Brada aos quatro cantos,
me espalha.

Pobre poeta,
não se livrará de minha sombra.
Pois “eu” sou você.
Em “mim”, há de se afogar.



quinta-feira, 26 de março de 2015

Prolegômenos

Pois é, também pensei que fosse um tipo de massa comestível. Mas temos aí um sinônimo para introdução.

O blog nasce para publicar alguns lances que tenho na cabeça, outros na gaveta, e chamo de poemas. Cada um fique a vontade para pôr o nome que quiser. Se conseguir te provocar um pouco, já atingi meu objetivo.
Bom, poesia incidente. Como se estivéssemos distraídos e algo nos atingisse em cheio! Soco na cara. Despertar, de repente, e se ver pelado no meio da rua.  Suspirar aliviado descobrindo ser um sonho (nem sempre; e o tempo não para).
Afinal, a vida é cheia dessas coisas que nos pegam de surpresa.
Não ignoro, por outro lado, a poesia esperada com minúcia.  O beijo no altar. Cheirinho de café pela manhã (para quem gosta).
Pra mim, poesia se confunde com subversão, nos dois sentidos. Até cogitei o título do blog nesse caminho. Que dois sentidos? Arte como sub-versão da realidade, farsa do destino. Qualquer canto é menor do que a vida de qualquer pessoa. Arte como subversão da realidade, embaralhando-a de ponta a cabeça, berrando suas inverdades. Então, já estou brincando com palavras, ofício do poeta.
Além das minhas bobagens, vou me dar ao trabalho de publicar a bobagem de outas pessoas. Pequenos e grandes poetas. Isso mesmo, poesia enquanto adorno inútil. Só que neste mundo de futilidades, algumas cores são menos desnecessárias do que outras.


Motivo