verso, prosa e frases soltas, gritos na noite, pulso que pulsa, meia-verdade, meia-justiça e um grilo falante

segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

AOS OLHOS REPRESADOS PELO TANQUE


Como aves da mata, sim: selvagem.

Como a vida suspensa sob a lança.

Como os raios, a chuva e como o vento

batendo contra os álamos na sombra.



Contra os muros e grades, sim: selvagem.

Contra os falsos brasões da tolerância.

Selvagem como o eterno movimento

do mar em seu assomo de esperança.



Selvagem. Solidão que irradia

no desprezo das cômodas estâncias.

Selvagem. Como humano cata-vento

movido em primitivas reentrâncias.



Selvagem. Como a intérmina coragem

numa luta impossível como gigantes.

Selvagem como o amor solto no ventre

como o fuso que fere mas descansa.



Sim: selvagem. Por isso tão liberta

tendo auroras e guizos nas entranhas.

Sim: selvagem. Por isso tão estranha

aos olhos represados pelo tanque.



Lucila Nogueira, Almenara, 1979

Nascida no Rio de Janeiro em 30/03/1950, filha de pai português e mãe pernambucana. Falecida em 25/12/2016. Uma poetisa consagrada sem raízes, no exílio de si.

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